Na última semana, um morador de Blumenau que vivia em um relacionamento homoafetivo obteve uma medida protetiva com base na Lei Maria da Penha. A decisão, deferida em menos de 24 horas após o pedido, foi concedida em favor de um homem que vivia uma união estável marcada por episódios de violência física, psicológica e constantes xingamentos, segundo o advogado Alexandro Maba.
Ainda conforme o advogado, o pedido foi protocolado na quarta-feira, 19, e deferido pela Justiça na quinta-feira, 20, no fim do dia. A medida foi fundamentada na recente decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que ampliou a aplicação da Lei Maria da Penha para casais homoafetivos, assegurando maior proteção contra a violência doméstica, independentemente do gênero.
STF amplia proteção da Lei Maria da Penha
Em meados de fevereiro, o STF decidiu que a Lei Maria da Penha pode ser aplicada às relações afetivo-familiares de casais homoafetivos do sexo masculino ou que envolvam travestis e mulheres transexuais. Por unanimidade, o Plenário entendeu que há omissão do Congresso Nacional em legislar sobre a matéria.
O tema foi analisado no Mandado de Injunção (MI) 7452, em sessão virtual encerrada no dia 21 de fevereiro. Esse tipo de ação visa garantir direitos e liberdades constitucionais na falta de norma regulamentadora torne inviável seu exercício.
A Associação Brasileira de Famílias HomoTransAfetivas (ABRAFH) questionava a demora do Congresso Nacional em aprovar uma legislação específica sobre a matéria.
O relator, ministro Alexandre de Moraes, constatou que há uma omissão significativa do Poder Legislativo em proteger direitos e liberdades fundamentais dessas comunidades, que têm projetos de lei ainda não concluídos. E, para o STF, apenas a tramitação de projetos de lei sobre a matéria não afasta o reconhecimento da omissão inconstitucional.
A seu ver, apesar de haver outras normas que responsabilizam de forma genérica agressões e outros delitos contra a vida e a integridade física, a Lei Maria da Penha prevê uma série de medidas protetivas reconhecidamente eficazes para resguardar a vida das mulheres vítimas de violência doméstica.
Contudo, para o relator, o Estado tem a responsabilidade de garantir proteção a todos os tipos de entidades familiares no âmbito doméstico. Por isso, a norma deve ser estendida também aos casais homoafetivos do sexo masculino, caso o homem vítima de violência esteja em uma posição de subordinação na relação. De acordo com o ministro, estudos nacionais e internacionais apontam um número significativo de vítimas de violência doméstica nessa população.
Para o ministro Alexandre de Moraes, a Lei Maria da Penha também deve alcançar travestis e transexuais com identidade social feminina que mantêm relação de afeto em ambiente familiar. Ou seja, a expressão ‘mulher’ contida na lei vale tanto para o sexo feminino quanto para o gênero feminino, “já que a conformação física externa é apenas uma, mas não a única das características definidoras do gênero”.
Em sua conclusão, o relator aponta que a não incidência da Lei Maria da Penha aos casais homoafetivos masculinos e às mulheres travestis ou transexuais nas relações intrafamiliares pode gerar uma lacuna na proteção e punição contra a violência doméstica, “já que esses acontecimentos permeiam a sociedade de forma atroz”.
Os ministros Cristiano Zanin, André Mendonça e Edson Fachin acompanharam o relator com uma ressalva: permitir, enquanto não editada a legislação específica, a aplicação das medidas protetivas de urgência previstas na Lei Maria da Penha a homens em relacionamentos homoafetivos, mas afastada a possibilidade da aplicação de sanções de natureza penal cujo tipo tenha como pressuposto a vítima mulher.